Falsos problemas e pseudo-soluções

 

Os únicos que se beneficiaram com transgênicos foram empresas multinacionais

 

Num remake contemporâneo do argumento malthusiano, os defensores dos transgênicos alegam que eles são necessários para garantir alimentos a uma população mundial em aumento, num cenário de crescente esgotamento de terras agricultáveis.

 

Também servem de argumentos subsidiários a tese de que os transgênicos tolerantes a herbicidas e resistentes a pragas evitariam o emprego de maior quantidade de agrotóxicos, e que os transgênicos resistentes à seca permitiriam a adaptação de plantas às mudanças climáticas em curso.

 

Se não for suficiente, ainda são capazes de sacar do colete os chamadostransgênicos do bem”, plantas que seriamengenheiradaspara fornecer maior quantidade do que a habitual de vitaminas, outros nutrientes importantes ou até vacinas, resolvendo o problema de populações pobres sem acesso a alimentos e medicamentos.

 

Mas assim como Malthus foi derrotado pela históriapois a humanidade hoje produz muito mais alimento do que no passado, mesmo tendo crescido a taxas insuspeitadasos estudos demográficos atuais indicam uma clara tendência da população do planeta a uma estabilização nas próximas décadas. Países do primeiro mundo têm hoje populações decrescentes e mesmo países como o Brasil exibem taxas de fecundidade abaixo do necessário para a reposição da sua população.

 

E quanto à prometida redução do emprego de agrotóxicos? Para o desespero de todos os que lidam com a saúde pública, o Brasil se tornou nos últimos anos o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. E a situação tende a piorar, pois devido a um processo bastante conhecido de desenvolvimento de resistência por parte das ervas invasoras, o agrotóxico mais utilizado na soja transgênica, o glifosato, não faz mais efeito.

 

A “soluçãoencontrada pelas empresas de biotecnologia são novos transgênicos tolerantes ao 2,4,D, um herbicida parente daquele Agente Laranja utilizado pelos norte-americanos no Vietnã. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), está prestes a liberar soja e milho transgênicos tolerantes ao 2,4, D.

 

Finalmente os chamadostransgênicos do bem”, de função essencialmente propagandística, têm dificuldades de emplacar. Não foi possível convencer orientais a comerem vários pratos de “arroz douradotodos os dias, assim como não faz sentido pesquisas para concentrar vitaminas em certos alimentos, em vez de tratar de assegurar o direito de todos a uma alimentação adequada e equilibrada.

 

Os únicos que se beneficiaram com os transgênicos foram empresas multinacionais de biotecnologia que os patenteiam e conquistam com isso fatias crescentes de um mercado mundial de sementes altamente monopolizado, além do agronegócio brasileiro, que visa lucros de curto prazo, indiferente aos impactos ambientais, na saúde pública e na agricultura familiar.

 

Dez anos após a liberação comercial do primeiro transgênico no Brasil, a soja RR da Monsanto, por meio de uma Medida Provisória do governo Lula, mais do que passou a hora do país começar a exigir pesquisas científicas sérias para avaliar os danos à saúde, ao meio ambiente e à agricultura familiar dos transgênicos.

 

(*) Marijane Vieira Lisboa, socióloga, professora da PUC-SP, membro da CTNBio, representante das entidades de consumidores