O acordo EUA-Coreia do Norte de 2012

 

Uma série de problemas potenciais parecem claros nas declarações unilaterais de ambos os países

 

O recente acordo firmado entre os Estados Unidos e a Coréia do Norte é um passo importante por três razões. A primeira, porque ganha tempo. Outro teste nuclear acompanhado do anúncio da Coréia do Norte ter conseguido miniaturizar ogivas para mísseis faria uma situação ruim ficar ainda pior. O acordo coloca essa possibilidade mais distante, dependendo do progresso a ser feito em novas negociações.

 

Em segundo lugar, além de parar as atividades de sua usina de enriquecimento de urânio, se a Coréia do Norte permitir que os inspetores da AIEA verifiquem a suspensão de seu funcionamento, será possível conhecer mais sobre o atual estágio de seu programa nuclear. Note-se que apenas um grupo de estrangeiros convidados viu o interior da instalação, e apenas brevemente. O interessante é que os norte-coreanos sabem que um futuro monitoramento irá revelar mais informações sobre suas capacidades. Por que eles estão dando esse passo? É difícil dizer.

 

Finalmente, este arranjo pode ajudar a construir uma base para novos progressos no sentido de parar e, eventualmente, até reverter, o esforço nuclear da RPDC. Muitos especialistas falam sobre "desnuclearização", não sabendo que tal processo não pode acontecer do dia para a noite, especialmente com um programa que tem quase cinco décadas. Note-se que a Coréia do Norte não é a Líbia: sua eventual “desnuclearizaçãoexigirá em primeiro lugar um “congelamentopara depois ser iniciada umareversão”, que vai levar tempo.

 

Uma série de problemas potenciais parecem claros nas declarações unilaterais de ambos os países. A distribuição de alimentos não será um problema, que grande parte dos detalhes estão resolvidos. A implementação da moratória, no entanto, parece ser difícil, pois requer que a Coréia do Norte e a AIEA trabalhem em medidas de salvaguardas, particularmente na usina de enriquecimento de urânio de Yongbyon. uma história de péssimas relações entre os dois, embora todas as poucas vezes que a Coréia do Norte consentiu cooperar com a AIEA, claramente o fez porque era do seu interesse, como parece ser dessa vez.

 

A declaração unilateral da Coréia do Norte deixa claro também que "prioridade será dada à discussão das questões relativas ao levantamento das sanções e fornecimento de usinas nucleares". Pyongyang insiste que isso deverá acontecer para que ela desista de seu programa de enriquecimento de urânio e armas nucleares. Isto é problemático, pois nenhum país está interessado em fornecer usinas nucleares à Coréia do Norte. Mas a China pode ser uma exceção, desde que o Ocidente pague a conta.

 

Alguém poderia perguntar por que este acordo foi alcançado agora? É uma boa pergunta. Todos os especialistas vinham opinando que nada iria acontecer em 2012, uma vez que este é um ano eleitoral nos EUA e Pyongyang teria pouco interesse em chegar a novos acordos. O acordo foi uma grande surpresa para muitos. É difícil dizer o que está acontecendo, exceto que agora os EUA parecem ter entendido que a sua política de "paciência estratégica", tentando convencer Pyongyang a mudar o seu mau comportamento por meio de pressão e isolamento, falhou. Pressão e isolamento são bons, mas sem estender a mão através da diplomacia, se transformam num beco sem saída. Qualquer semelhança com o caso iraniano não é mera coincidência.

 

Sobre o porquê da Coréia do Norte ter feito este movimento, alguns poderiam dizer que esse acordo prova que a "paciência estratégica" dos EUA tem trabalhado e Pyongyang estádando o braço a torcer”. Analistas mais atentos, entretanto, acreditam que isso pode refletir um desejo da Coréia do Norte de escapar do “abraço do urso chinês”, no contexto de um relacionamento que hoje é muito mais forte do que foi no passado. Outros vêem como um passo tático feito porque a Coréia do Norte quer manter um ambiente externo calmo durante o primeiro ano de sua transição de liderança. Outros ainda acreditam que o Norte concordou com uma moratória porque realmente não está pronto para realizar mais testes nucleares ou de mísseis e precisa de tempo para trabalhar mais seu programa de enriquecimento nas instalações de Yongbyon. Todas essas explicações são possíveis.

 

*Leonam dos Santos Guimarães é doutor em engenharia naval e nuclear, assistente da Presidência da Eletrobrás Eletronuclear e membro do Grupo Permanente de Assessoria da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica)