Espionagem abala diplomacia
americana
A
denúncia de que europeus também são vigiados coloca
a crise da arapongagem em plano crítico e exige esforço da
Casa Branca para proteger elevados interesses
EDITORIAL
26/10/13
- 0h00
Enquanto o assunto estava circunscrito à América Latina, os danos eram limitados.
Não que sejam
pequenos; afinal o vazamento de que a NSA (Agência Nacional de Segurança), o “grande irmão” americano, espiona autoridades no México e Brasil — neste caso, a própria presidente Dilma e a Petrobras — colocou em choque com a Casa Branca dois peões-chave
no jogo diplomático ao Sul do Rio Grande. Mas, com o envolvimento no escândalo de França e Alemanha, a encrenca se tornou bem maior,
por envolver uma agenda de pesados interesses, de impacto mundial.
Assim como ocorreu no Brasil, em que O GLOBO
e o “Fantástico”, da TV Globo, revelaram as ações de espionagem, com base em material de posse de Edward Snowden — por meio de Glenn Greenwald, jornalista americano —, na Europa também
coube a veículos de imprensa dar a má notícia ao
presidente francês,
François Holland, e à chanceler alemã,
Angela Merkel. Esta teria sido bisbilhotada inclusive no próprio aparelho celular. De acordo com o inglês “Guardian”, 35 líderes mundiais foram grampeados pela NSA. O “Le
Monde”, francês, noticiou que os americanos
vigiariam, por meios eletrônicos, as representações diplomáticas do país na ONU,
Nova York e Washington. Holland se viu forçado a reclamar, por telefone, com o colega Barack Obama. Depois, seria o “L’Espresso” a incluir o governo italiano entre os alvos dos espiões.
O
mal estar aumenta pelo fato de a Inglaterra de David Cameron, com assento
na União Europeia, ao lado
de espionados, ser um dos “Cinco
Olhos”, cujas agências de informações atuam em conjunto
no mundo — além da NSA e a coirmã inglesa, a australiana e neozelandesa.
A
crise, capaz de abalar a Aliança Atlântica, essencial para a geopolítica do Ocidente, pode viabilizar a proposta já feita pela
presidente Dilma e repetida anteontem: um entendimento multilateral para que se estabeleçam e se monitorem limites à vigilância eletrônica, um cuidado necessário também em nível
nacional.
Reunidos ontem, em Bruxelas, 28 líderes europeus emitiram nota em apoio à iniciativa francesa e alemã de renegociar com os americanos a cooperação do continente com os Estados Unidos no campo da inteligência e informações.
David
Cameron, por ser sócio dos americanos na área,
tomou o cuidado de garantir que a agência de seu país não atuou
nas operações denunciadas. Atuou em Bruxelas como
“bombeiro”. Há mesmo muito assunto
sensível em jogo.
Tão logo circularam
as primeiras denúncias, houve quem propusesse
a suspensão das negociações
para a criação do que poderá ser o maior bloco comercial
do planeta. Há, ainda, sobre a mesa, a participação europeia nos esforços para
o fim da guerra civil na Síria. E a fim de afastar de vez o risco de um Irã com armas nucleares.
Os
EUA precisam, de fato, acionar seus
clássicos “pesos e contrapesos”
para conter e regular seus arapongas eletrônicos.