Quando Israel se sente sitiado
clóvis rossi
24/07/2014
Um
dos foguetes que o Hamas disparou sobre Israel fez mais estragos que
os outros 2.158 lançados desde o dia 8 até esta
terça-feira (22).
Foi o que atingiu uma casa na cidade de Yehud,
a 2 quilômetros do aeroporto
Ben Gurion de Tel Aviv, o que
levou a Agência Federal da Aviação norte-americana
a determinar o cancelamento
de todos os voos em direção
a Israel, movimento seguido
por boa parte das empresas aéreas europeias.
O
principal prejuízo decorrente
nem é financeiro, por mais que
a indústria de turismo israelense sinta o golpe, já que
é o auge do verão no hemisfério norte e, por extensão, da
temporada turística.
A
suspensão dos voos atinge em cheio
o moral dos israelenses, do que
dá testemunho o colunista Aharon Lapidot, do "Israel Hayom"
("Israel Hoje"), o de maior
circulação atualmente no país, ultraconservador e ultranacionalista.
Lapidot escreveu que a decisão da
agência norte-americana
"é um movimento dramático,
que aumentou a sensação de sítio e isolamento entre muitos israelenses".
Outro analista judeu vai um pouco
na mesma direção, mas referindo-se
aos foguetes do Hamas em geral e não
apenas ao que levou à suspensão
dos voos (inicialmente por 24 horas, mas
prorrogada nesta quarta-feira por outras 24).
Trata-se de Ariel Ilan
Roth, diretor-executivo do Instituto
Israel, centro de estudos baseado nos Estados
Unidos e destinado a informar sobre Israel.
Para
Roth, o objetivo estratégico
do Hamas é abalar a sensação
de normalidade dos israelenses:
"Só é possível para Israel existir como uma florescente
e próspera democracia, mesmo sob permanente conflito, quando seus cidadãos são
capazes de manter a ilusão de que suas
vidas são mais ou menos
similares às que aspirariam a ter em Londres,
Paris ou Nova York".
Não estou tão certo de que
a maioria dos israelenses
compare suas vidas em Israel como a que levariam se mudassem para as grandes capitais citadas. Ao contrário,
minha sensação das muitas viagens à região é a de um crescente orgulho nacionalista por viverem como
vivem mesmo sob fogo.
Lembro-me de uma vez ter entrado
em uma sala
de bate-papo para judeus, antes de viajar para cobrir uma
eleição lá, informando que gostaria de manter contato com pessoas comuns, em vez
de conversar apenas com os suspeitos de sempre (políticos, autoridades em geral, acadêmicos etc). Primeira resposta obtida: "Em Israel, não há pessoas
comuns".
Fecho o parêntesis
e volto a Ilan Roth, que acha que,
se sua premissa for correta, "o Hamas já ganhou". Ganhou porque "abalou a ilusão, necessária para os israelenses,
de que o impasse político
com os palestinos sai de graça para
Israel". Mais: "Mostrou
aos israelenses que, mesmo que
os palestinos não possam matá-los,
podem cobrar um pesado preço psicológico".
O
problema com esse raciocínio é que os palestinos também
estão sitiados e pagam um preço não apenas psicológico
mas em vidas
para que Israel possa sossegar a psique de sua gente.