Tendências/Debates - Uma nova voz no debate sobre as drogas
FERNANDO
HENRIQUE CARDOSO
CÉSAR
GAVIRIA
RICARDO
LAGOS
ERNESTO
ZEDILLO
GEORGE
P. SHULTZ
PAUL
VOLCKER
LOUISE
ARBOUR
Após mais de quatro décadas de guerra fracassada contra as drogas, as declarações pedindo mudanças profundas nessa estratégia aumentam a cada dia. Na América Latina, o
debate engrenou. Chefes de
Estado da Colômbia, Guatemala,
México e Uruguai assumiram
a liderança para transformar suas políticas nacionais de drogas, desencadeando forte dinâmica de mudança por toda a região
e ao redor do mundo.
A
discussão chegou aos Estados Unidos.
Pela primeira vez, a maioria dos norte-americanos apoiam a regulação da maconha
para uso adulto. Em nenhum
outro lugar tal apoio é tão
evidente como em Washington e Colorado, que aprovaram leis locais nesse sentido.
A
mudança na opinião pública representa um desafio não apenas à lei federal dos EUA, mas também
às convenções da ONU e ao
regime internacional sobre drogas.
Desde 2011, a Comissão
Global de Política sobre Drogas, formada a partir da mudança
de paradigma apresentada pela Comissão Latino-Americana de
Drogas e Democracia, tem insistido nesse caminho. Mais de 20 lideranças globais vêm expondo as consequências desastrosas de políticas repressivas.
Nosso relatório
"Sobre a Guerra às Drogas" traz duas recomendações principais: substituir a criminalização do uso de drogas por uma
abordagem de saúde pública e experimentar modelos de regulação legal de drogas ilícitas para reduzir o poder do crime organizado. Ao promover uma
verdadeira conversa global sobre a reforma na política de drogas, nós quebramos
um tabu que perdurava há mais
de século.
Na
semana passada, uma inesperada voz foi adicionada
ao debate. O secretário-geral
da Organização de Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, apresentou ao presidente
Juan Manuel Santos, da Colômbia,
uma resposta à demanda dos chefes de Estado americanos.
O
estudo da OEA propõe quatro
possíveis cenários e reflete um consenso emergente na América
Latina. Felizmente, nenhum cenário insiste em manter o status quo. A maior parte dos especialistas subscreve aos três
primeiros cenários --trocar a repressão por abordagens que privilegiem a segurança cidadã, experiências com diferentes formas de regular drogas ilícitas e o fortalecimento da resiliência comunitária. Obviamente, todos concordam que o quarto cenário --a ameaça da criação
de narcoestados-- deve ser evitado a qualquer custo.
Na
prática, o relatório é o primeiro tratado de reforma de política de drogas proposto por uma organização
multilateral. Indica caminhos
complementares e não excludentes. Parte da premissa realista de que a demanda por
substâncias psicoativas continuará a existir e que apenas uma
pequena parte dos usuários
se tornará dependente.
De
fato, vários países e Estados já estão descriminalizando
o uso de drogas, testando a regulação da maconha e implementando
programas de redução de danos incluindo o fornecimento medicinal de drogas como a heroína. Essas políticas têm gerado resultados
positivos e mensuráveis, e não o agravamento do consumo.
É
tempo de permitir aos governos do mundo que, de forma responsável, experimentem modelos adequados às suas
necessidades locais. A liderança demonstrada pelo presidente Santos e o secretário-geral da OEA é bem-vinda. Porém, o relatório é apenas um começo --autoridades do continente devem considerar seriamente as propostas de cenários e avaliar como suas políticas
nacionais podem ser melhoradas. Assim, romperão com o ciclo vicioso de violência, corrupção e prisões superlotadas e priorizarão a saúde e a segurança das pessoas.
FERNANDO
HENRIQUE CARDOSO, ex-presidente do Brasil, CÉSAR GAVIRIA, ex-presidente da Colômbia,
RICARDO LAGOS, ex-presidente do Chile, ERNESTO
ZEDILLO, ex-presidente do México, GEORGE P. SHULTZ,
ex-secretário de Estado dos EUA,
PAUL VOLCKER, ex-presidente do Federal Reserve, e
LOUISE ARBOUR, ex-alta comissária das Nações Unidas para Direitos
Humanos, são membros da Comissão
Global de Política sobre Drogas