América Latina, retórica e EUA
22/02/2010
Do presidente
do México, Felipe Calderón, ao
inaugurar ontem a cúpula chamada de Unidade da América
Latina e do Caribe, que reúne os 33 países
das Américas, excetuados os dois mais
ricos (Estados Unidos e Canadá):
"Não
podemos permanecer desunidos, não podemos abordar o futuro com êxito com base em nossas diferenças;
agora nos toca unir-nos, sem demérito
daquilo em que somos diferentes
(...), unir-nos sobre a
base de nossas coincidências
que são muito
maiores do do que nossas divergências".
Do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, ao fechar
a primeira cúpula do gênero, realizada no fim de 2008 em Salvador, Bahia:
"Todos
nós,
do menor ao maior país, estamos
compreendendo que, quanto mais nos
juntarmos, mais chances teremos de participação nas políticas globais,
mais chances de participação
na riqueza global e mais chances de evitar que a crise, nascida
nos países riscos, atinja muito fortemente os países que
não criaram a crise".
Os dois
discursos servem para pontuar o fato de que a
América Latina-Caribe
continua sendo o subcontinente
da retórica copiosa, das mil tentativas de integração e da pouca união. Nada de novo, aliás: em seu
discurso, Calderón lembrou que a
integração "é a vocação
natural de nossos povos e aspiração natural desde a própria origem de nossas nações independentes".
Para fazer as contas: este ano, começa
a comemoração dos 200 anos da independência das antigas colônias espanholas nas Américas.
Ou seja, não
é apenas de uma cúpula para outra,
com pouco mais de um ano de intervalo, mas há 200 anos
que os dirigentes
latino-americanos tocam a mesma canção, mas
não vão nunca
a lugar algum, a não ser a uma nova cúpula.
É uma
pena, porque Lula tem razão --além de ser uma obviedade-- ao dizer que
"quanto mais nos juntarmos, mais chances teremos de participação nas políticas globais".
É até
compreensível que haja dificuldades em avançar na
integração, dada a heterogeneidade
dos 33 países participantes
da cúpula ontem inaugurada, que vão do miserável
Haiti ao emergente Brasil. Mas não
é a heterogeneidade, no momento,
o obstáculo maior: a grande dificuldade está em definir
que papel os 33 pretendem para os Estados
Unidos, se o de inimigo (como querem os
bolivarianos, liderados pela Venezuela) ou de parceiro que respeite
e não subjugue a região, como prefere
o Brasil, entre outros.
Não dá, por
fatalidade geográfica,
pretender que os Estados Unidos (e o Canadá) não fazem
parte das Américas. Não dá, por fatalidade
geopolítica e econômica,
pretender que os Estados Unidos não exercem tremenda
influência no subcontinente.
Logo, é preciso, antes de mais nada, definir os termos em
que se pretende exercitar a unidade latino-americana e caribenha:
contra os Estados Unidos ou ao
lado dele.