A guerra cambial no G-20

 

15 de fevereiro de 2013

 

A guerra cambial denunciada com insistência pelo governo brasileiro deve ser um dos grandes temas da reunião do Grupo dos 20 (G-20) em Moscou, hoje e amanhã. A maior parte dos governos do mundo rico nem sequer reconhece, oficialmente, a existência do problema, até porque alguns deles foram acusados, nos últimos anos, de manipular o câmbio para criar vantagens comerciais. Mas o assunto acabou entrando, nos últimos dias, na pauta das principais potências desenvolvidas. Autoridades do G-7, formado pelas maiores economias capitalistas, comprometeram-se na terça-feira a deixar o câmbio entregue às forças do mercado. Renunciaram oficialmente, portanto, a manipulações para depreciar suas moedas e tornar mais baratos e mais competitivos os produtos de seus países. O compromisso de bom comportamento e de estrita vigilância das cotações foi assumido pelos Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá. Não como deixar o problema fora da agenda deste fim de semana.

 

Três fatos puseram em destaque a questão cambial nos últimos dias. O primeiro foi a nova e mais expansionista política monetária japonesa. O objetivo oficial é a reativação da economia, afetada por uma persistente deflação. Uma das consequências imediatas foi a desvalorização do iene, um benefício a mais para a indústria do Japão. O segundo fato foi o reconhecimento da valorização do euro pelo presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi. O terceiro, a cobrança, pelo presidente francês, François Hollande, de uma política de competitividade para o euro.

 

Sob a liderança alemã, a maioria dos governos europeus continua oficialmente contrária a intervenções no câmbio. Mas a saída encontrada foi levar a sério o risco de uma competição cambial, propor aos governos das maiores potências um compromisso de não intervenção e, além disso, aproveitar a oportunidade para dar um recado ao governo e ao banco central do Japão.

 

Desde o começo da recessão, em 2008, representantes das maiores economias desenvolvidas e emergentes têm prometido evitar medidas protecionistas e apoiar a continuada expansão do comércio livre. Apesar disso, barreiras foram erguidas, mas a promessa foi reiterada várias vezes nos anos seguintes.

 

A questão cambial sempre esteve presente, mas de forma limitada. Pressionar as autoridades chinesas para permitir a flutuação do renminbi tem sido, muito tempo, um item obrigatório nas reuniões do G-7, do G-8, do G-20 e das principais entidades multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI). Autoridades brasileiras têm tentado, isoladamente, forçar também uma discussão sobre as políticas monetárias dos Estados Unidos e da zona do euro e seus efeitos no mercado cambial. O sucesso tem sido praticamente nulo. Tanto as autoridades americanas quanto as europeias alegam recorrer à expansão monetária apenas para estimular suas economias, sem o objetivo direto de afetar o câmbio.

 

Mas suas explicações são muito parecidas com a linguagem do comunicado de terça-feira. Segundo os representantes do G-7, suas "políticas fiscal e monetária têm sido e continuarão a ser orientadas no sentido de cumprir" os objetivos nacionais "com instrumentos domésticos", sem ter como alvo as taxas de câmbio. A discussão proposta pelo governo brasileiro continua, em tese, tão difícil quanto antes. Pode-se mostrar o efeito cambial de uma medida monetária, mas como provar intenções?

 

As autoridades brasileiras têm tentado, até agora sem sucesso, incluir o câmbio na pauta da Organização Mundial do Comércio (OMC). Até chineses, americanos e europeus têm-se unido contra a pretensão brasileira. A discussão do G-7 aparentemente abriu algum espaço para mais uma tentativa brasileira, mas o próprio texto do comunicado é pouco animador. Talvez a reunião do G-20 resulte em alguma declaração semelhante, emitida em nome de um número maior de países, mas qualquer resultado de maior alcance prático será uma surpresa. A discussão em Moscou talvez contribua para manter vivo o assunto na OMC. Do ponto de vista do governo brasileiro, será um ganho.