Três lições americanas
Em tempos de crise
é mais importante um político com experiência do que um com conhecimentos de economia.
João
Marques de Almeida
Para um liberal de centro-direita europeu,
McCain é o candidato norte-americano
preferido. Pela sua visão liberal sobre a sociedade e a economia, é preferível
a qualquer outro candidato republicano. Tenho o maior respeito
pela religião Cristã e pelo seu
lugar único na história do ocidente (da qual,
de resto, me orgulho, e muito), mas acho
que anos de sermões nas igrejas
do sul dos Estados Unidos, onde rapidamente
se perde a racionalidade, não é a melhor preparação para se chegar ao poder.
Esta posição não revela igualmente
nenhuma antipatia especial pelos candidatos democratas, apesar da participação demasiado activa de Bill Clinton na candidatura
da sua mulher
me cause algum desconforto.
Por uma questão
de princípio, não é bom que uma
pessoa não-eleita venha a ter uma
enorme influência sobre o futuro presidente, como
acontecerá se Hilary Clinton for eleita.
Quanto a Obama,
tem indiscutivelmente talento
político e carisma. Não estou, porém, convencido
que esteja preparado para ser presidente americano. Identifico-me, além disso, muito mais com a visão de McCain sobre o mundo e os seus
perigos e ameaças do que com as posições de Clinton e
de Obama. Há quatro questões que, na perspectiva da Europa, são fundamentais:
manter as tropas no Iraque; impedir o Irão de ter armas
nucleares; empenhar-se nas negociações da Organização Mundial de Comércio, reforçando o sistema de comércio livre global; e renovar a aliança transatlântica, reformando a NATO em 2009. Não estou certo
que um presidente democrata se empenhe, como McCain, nestes
quatro objectivos.
Além destas razões, há três
motivos que me levam mesmo a
olhar para a candidatura de McCain com entusiasmo.
O primeiro tem a ver com o carácter e a personalidade de
McCain. Há poucas coisas melhores do que ver um político
livre. Quando a maioria dos líderes republicanos, incluindo os restantes candidatos
(à excepção de Giuliani),
se esconderam e mudaram de opinião sobre o Iraque, durante
as eleições para o Congresso em 2006, McCain manteve a sua posição.
Passou o grande teste: foi fiel
às suas convicções
numa altura em que eram
profundamente impopulares. Privilegiou o que considera ser o interesse norte-americano em detrimento da
sua carreira política imediata. No
final do ano passado, estava quase acabado.
Um mês depois,
é o principal favorito a vencer
as primárias entre os republicanos. Esta é a lição de McCain.
Em segundo lugar, se McCain for eleito presidente em Novembro, pode
mudar o Partido republicano. Como todos os grandes
partidos de sistemas políticos bipartidários, os republicanos são uma coligação
de várias famílias políticas e ideológicas.
As presidências de Bush reforçaram
o poder e a influência dos conservadores religiosos. No entanto, para ser eleito duas vezes, não
chega ter o apoio de uma tendência.
Os outros vencedores
dos anos de Bush, nomeadamente
os herdeiros de Reagan e os neo-conservadores, estão quase todos
agora ao lado de McCain.
Ironicamente, tendo em conta muitos
comentários que se fazem na
Europa, os neo-conservadores podem desempenhar um papel crucial na derrota dos conservadores religiosos no
interior do Partido republicano.
Apesar de tempos recentes complicados, os republicanos parecem entender que a radicalização ideológica é o pior que pode
acontecer a um partido que quer
ganhar eleições. Esta é a lição do Partido republicano.
Por fim, o eleitorado parece estar pronto para desafiar uma verdade,
com um estatuto quase absoluto: que em
tempos de crise económica, a economia decide eleições. Desde as primárias do Michigan, Romney encontrou
o tema da sua campanha: é o candidato melhor preparado para resolver a crise económica americana.
Acusou mesmo o seu principal rival de
nada perceber de economia.
Apesar disso, McCain ganhou
na Carolina do Sul e na Florida. Como não se prevê que
a economia melhore até ao
fim das primárias,
nem se espera que entretanto o senador do Arizona se torne um especialista em finanças, se McCain for nomeado,
a verdade começa a deixar de ser absoluta. E ainda bem, porque está apoiada
em ideias erradas. Não são os governos que resolvem
as crises económicas, nem criam emprego, nem aumentam o crescimento económico. O que se pede é que
não tomem decisões que prejudiquem
a economia. Como acontece em muitas
áreas, também na economia,
os governos têm muito poder
para fazer mal, e pouco para fazer
bem. Se se perceber isto, entende-se que em tempos de crise é mais importante um político com experiência do que um com conhecimentos de economia. Esta seria a terceira
lição dos americanos. E a mais útil
de todas para os europeus.
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João Marques de Almeida, Doutorado
em Relações Internacionais