EUA invadem a privacidade do mundo inteiro
Sob
o pretexto de que é preciso atacar o terrorismo, as ações do Tio San se estendem por todo planeta.
Com ameaças e ataques contínuos, mantém-se a estratégia da submissão da
cidadania por meio do medo.
Luiz Flávio Gomes
No
outono de 2013, depois das denúncias de Snowden, confirmou-se
(o que todos já sabiam ou
pressentiam) que os EUA fazem
espionagem do mundo inteiro. Milhões de e-mails e ligações, inclusive de brasileiros,
foram captados pelo Guardião do Mundo!
Depois da Segunda Guerra Mundial, os EUA dominaram o mundo pelo prazer
do consumo (economia
neoliberal de mercado livre),
transmitindo a mensagem de que o bem estar
material de cada cidadão (transformado em consumidor) constitui a finalidade última do ser humano. Quando o consumismo chegou à exaustão, elegeu-se o medo para ancorar
a sua dominação. Vivemos a era da dominação pelo medo. O medo é o fator de integração dos EUA (e, em certo
sentido, do planeta). Sem população amedrontada
não se exerce o domínio autoritário.
Um
dos meios de manutenção do medo é o massacre. Mas todo massacre (para incrementar o medo) depende da eleição
de um inimigo. Na Idade Média a Igreja católica elegeu como inimigo as bruxas. Nunca se achou uma bruxa.
Mas a guerra contra elas aconteceu (cerca de 100 mil mulheres foram massacradas). Nos anos 60 e 70, o inimigo dos EUA era o comunismo (marxismo). Foi derrotado (o momento espetacular ocorreu em 1989, com queda do muro de Berlim). No final dos anos 70 o inimigo passou a ser o Estado de Bem-Estar social (Wellfare
State). Foi derrotado, pelo capitalismo neoliberal de mercado livre (o desemprego ou sub-emprego, instabilidade salarial, destruição da natureza etc., são expressões dessa “vitória”).
Concomitantemente a essa guerra contra o Estado providência eclodiu a guerra contra as drogas (1971,
Nixon). Esta nunca foi vencida (nem
nunca será). Depois vêm guerra
do Golfo pérsico, guerra contra o Afeganistão, guerra contra o Iraque (as armas químicas estão para Sadam
Hussein como as bruxas estavam para a Inquisição católica), guerra contra a Líbia, guerra contra Bin Laden, guerra
contra o terrorismo islâmico
etc.
Sob
o pretexto de que é preciso atacar o terrorismo, as ações do Tio San se estendem por todo planeta.
Com ameaças e ataques contínuos, mantém-se a estratégia da submissão da
cidadania por meio do medo. O direito internacional não vale para os
EUA, violações constantes aos direitos humanos são ignoradas, Guantánamo e suas humilhações estão mantidas, está justificada a tortura, paraísos de ilegalidades estão espalhados pelo mundo todo.
Loïc Wacquant chama isso de “Era Torturante” (quem passou por algum
aeroporto internacional nos últimos anos
sabe bem o que é isso: humilhação
e sensação de um perigo iminente; perante seus escâneres, toda nudez nunca
será castigada). Nossos pertences (cintos, sapatos, carteiras, relógios, celulares, líquidos etc.), tal como ironiza
Carlos París (Ética
radical, p. 150), “são portados
numa bandeja como se fosse uma oferenda ao deus
protetor dos ameaçados cidadãos do globo terrestre”. São truques para a manutenção do medo. Todo mundo,
nos aeroportos, deve recordar que
existe uma ameaça planetária. O objetivo das encenações, claro, consiste em manter a cidadania
amedrontada, porque é assim que se conquista
sua submissão.
Luiz Flávio Gomes
é jurista e diretor-presidente
do Instituto Avante Brasil
(www.
institutoavantebrasil.com.br).