O voto papal
Lucas Mendes
Bento 16 é um conservador, mas será que votaria
em John McCain? Os papas nunca visitaram os Estados Unidos
em anos eleitorais
para evitar impressões de favoritismo político, mas por
mais neutra que seja a batina
papal, as mensagens dele poderão
e serão usadas pelos candidatos.
Bento 16 tem vários motivos não políticos para
visitar os Estados Unidos num ano eleitoral: ele é convidado da ONU para a comemoração
dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, em 1948 em San Francisco; algumas
dioceses americanas estão fazendo 200 anos e é a primeira visita de um Papa depois do 11 de setembro. E, este ano, o número
de muçulmanos ultrapassou o
número de católicos no mundo.
São motivos
fortes para reforçar as conexões do Vaticano com os católicos e não-católicos americanos, mas cada vez
que Bento 16 abrir a boca, os democratas
e o republicano vão interpretar e "espinar"
segundo seus evangelhos políticos.
"Espinar"
ainda não existe em português.
Vem do verbo to spin,
girar, como um pião, e aqui é usado no sentido "espalhar a mesma informação" em diferentes direções conforme os interesses
próprios. Como papas costumam
falar em papês, as mensagens sempre podem dar margem
a mais de uma interpretação.
No caso
de Bento 16, algumas posições
são claras: ele é contra o aborto e o senador McCain teria o voto dele.
Também nas questões da imigração
e do casamento gay o republicano
levaria o voto do Papa. Em impostos ninguém leva o voto do Papa. Ele aprecia doações.
Também na questão
das células-tronco, nenhum dos três candidatos levaria o voto de
Bento 16, mas os democratas ganhariam, além do Iraque, nas questões referentes
à saúde, educação e direitos humanos.
O voto católico
é complicado e nem sempre previsível.
Antigamente, com Franklyn Roosevelt, os
católicos eram mais unidos e democratas,
mas o eleitorado rachou a partir da década de 70 e nos 80 aderiram ao bloco dos Democratas
pró-Reagan. Voltaram ao rebanho democrata
e com boa margem a favor de Bill Clinton, um protestante, e, em 2000, com uma vantagem mínima
a favor de Al Gore, mas votaram
contra um católico - John Kerry - inclusive em Ohio, um Estado decisivo.
Este ano a senadora
Hillary Clinton conseguiu grande
e decisiva maioria do voto católico em Ohio, no Texas, e vários outros Estados
contra Barack Obama e dão a ela
esperanças na Pensilvânia .
Bento 16 não
está interessado nestas picuinhas primárias. O horizonte dele vai mais longe.
A igreja católica
americana é a terceira maior do mundo - depois do Brasil e México -, a mais rica e a mais
influente. Também é mais fiel do que
a européia, que vem encolhendo. A igreja católica americana também perdeu um quarto do rebanho nos últimos 30 anos com suas posições
conservadoras sobre sexo, controle de natalidade, aborto, celibato clerical e 11 mil denúncias
de pedofilia.
Graças aos imigrantes
latinos e a um novo empenho de recrutamento de seminaristas, o número de padres
e fiéis voltou a crescer. Comparado com nós, latinos, e com europeus, os americanos
levam a religião mais a sério e vão à missa.
Um rebanho as vezes rebelde, mas fiel.
Durante esta visita
o alemão Bento 16 faz 81 anos, forte, rijo, preocupado com a paz e com os pobres. Merece
parabéns e nosso voto.